quinta-feira, 25 de outubro de 2007

PARADOXO

Não é estranho que Fidel Castro critique a produção de álcool combustível, alegando que seria prejudicada a produção de alimentos? Afinal, a maior parte das terras agricultáveis em Cuba são destinadas a plantações de fumo e de cana-de-açúcar (para a produção de açúcar mesmo, e não álcool).

Será que a dieta dos cubanos consiste em ingerir açúcar e mascar tabaco?

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

OH, QUE SAUDADES DA MINHA DITADURA QUERIDA...

Já se passaram quase 20 anos desde a transição para a democracia política, e mais do que isso desde o fim da censura à livre manifestação do pensamento. Todavia, parece que alguns ainda sentem saudade daqueles tempos.

Os oficiais e praças da Polícia Militar do Rio de Janeiro, por exemplo, manifestaram apoio integral à ação judicial impetrada por oficiais do Bope contra a exibição do filme nos cinemas brasileiros. Ou seja, querem evitar que a população veja qualquer resquício de realidade que o filme por ventura possa trazer. Já dizia um ministro: "o que é ruim a gente esconde".

Aliás, a própria Corregedoria da PM do RJ não gostou muito desse filme. Tanto o diretor deste, José Padilha, e o ex-capitão da Polícia Militar, Rodrigo Pimentel - um dos autores do livro “Elite da Tropa”, que inspirou esse filme - foram intimados a prestar depoimento na Corregedoria da PM. Caso se recusem a comparecer na data determinada, eles podem ser conduzidos por força policial.

Para piorar, o filme ainda desagradou muitos setores da sociologia barata brasileira. Estes, se pudessem, também o proibiram. Afinal, onde já se viu discordar da ladainha de que o bandido é um fruto de um "sistema perverso" (o capitalismo), que se vê obrigado a seguir uma vida de crimes? E não repetir que a polícia é um mecanismo repressivo, destinado a garantir o controle social de um Estado ilegítimo, que só quer proteger a "elite" (não seria oligarquia?)? Claro que existe muita pesquisa social séria no Brasil. O problema é que a sociologia que domina o ensino médio, os cursos de graduação e a mídia é essa acima.

Mas não farei uma análise sociológica do filme, até porque já existem muitos enganadores fazendo isso neste momento. Sem falar que é muito sacal fazer análise sociológica de peças de entretenimento. É politicamente correto demais.

O problema é que, em nome do politicamente correto, querem proibir o filme. Deve ser porque a "intelectualidade" não gostou do que viu. E também porque alguns setores do Estado não gostam que a população saiba de seus defeitos. Enfim, o coitado do diretor tomou pau de todos os lados.

Sorte nossa que até agora não apareceu nenhum juiz maluco admitindo a retirada do filme das salas de cinema. A repercussão negativa ao "Caso Cicarelli" deve ter escondido a saudade dos tempos em que bastavam alguns minutos para censurar qualquer opinião.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

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Orra, o Hellacopters acabou...

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

A FOTOSSÍNTESE

O dia amanhecera ensolarado naquele final de outubro. Da janela da sala de aula, no andar térreo, era possível avistar o último resquício de mata nativa nas redondezas desse novo prédio do Centro de Ciências Jurídicas. Um matagal que, não obstante a sua insignificância em área, era um foco de resistência contra o “progresso”, sendo saudosamente conhecido pelos acadêmicos, em razão da sua denominação, dada em homenagem a um dos docentes da casa.

A primeira aula do dia já rumava para o seu término, estando o professor ministrando as suas considerações finais, enquanto alguns dos colegas esperavam para expor suas dúvidas em relação à matéria lecionada. Aguardávamos, ansiosos, pelo intervalo, um breve momento de descanso que, embora exíguo, nos era extremamente salutar. E, naquele dia, o seria mais ainda, pois o sol, desaparecido em razão dos últimos dias chuvosos, aparecera radiante, trazendo consigo aquele clima típico do verão que se aproximava.

Como adorávamos o verão! Estação do calor, do sol, das tempestades refrescantes do final de tarde. Claro, o clima úmido e quente transformava as classes em verdadeiras fornalhas, tamanho o grau de insalubridade. Porém, ainda assim trazia os seus brindezinhos: as pessoas acordavam mais ativas, alegres e, algumas vezes, sensuais. Dias como aqueles eram perfeitos para rumarmos em direção ao gramado do prédio vizinho, permeado de bancos e arbustos, onde nos poderíamos estabelecer no ponto com a melhor visão de todo o local, para então darmos início ao que poderia ser cunhado “nosso ritual”.

Sim, esse ritual que cumpríamos religiosamente desde os primeiros dias de faculdade, sempre que o clima era propício para tanto. Começou quando ainda éramos calouros, anônimos uns aos outros, mas que tinham em comum o vigor decorrente dos hormônios que guiavam qualquer ser humano na flor da idade.

Chamávamos-lo de “fotossíntese”, nome deveras estranho para os meios jurídicos, porém compreensível para uma leva de recém-vestibulandos, ainda bitolados pelos conteúdos do ensino médio. E o era assim denominado porque, basicamente, ficávamos largados ao sol, refestelando-nos como lagartos preguiçosos, recompondo nossas energias enquanto absorvíamos todo aquele calor. A analogia com as plantas era – mais do que pertinente – óbvia.

Como passatempo – embora não nos agradasse que esse tempo passasse muito depressa – conversávamos sobre as mais diversas futilidades: algum assunto lido no jornal do dia anterior, na revista semanal, ou visto nos telejornais das primeiras horas da manhã. Apresentavam-se as mais variadas notícias, todas, naquela hora, de igual importância, fossem elas mexericos de política, religião, futebol, ou algum outro tema de relevante interesse para a segurança nacional. Enfim, o que melhor aprouvesse ao humor dos companheiros de conversa.

Qualquer que fosse o tema escolhido, as discussões eram acaloradas, alternando-se as opiniões nos debates. Fervilhava-nos a paixão pelos discursos, como senadores a decidir o futuro da nação, ou como futuros juristas a fazer uma explanação oral. Não havia problema insolúvel; dali, saíam respostas para todas as mazelas que afligem o mundo! Sentíamo-nos como grandes filósofos do pensamento ocidental, oráculos de sabedoria dos meios acadêmicos.

Porém, o assunto principal desse plenário não poderia ser outro: os dotes físicos das respeitáveis senhoritas que por ali passavam. Não, caros senhores, não se tratava de perversão dos ilustres jovens. À primeira vista, pode parecer que agíamos de forma deveras machista, como meros fornicadores, ávidos por um belo par de pernas femininas.

Todavia, naquela hora não alimentávamos a lascívia. Nossa prática limitava-se tão somente a uma espécie de idolatria pagã, cujas deusas não ficavam confinadas a um Monte Olimpo ou a um Valhala. Que imensa vantagem tínhamos sobre os guerreiros da Antigüidade! Para eles, aproveitar as benesses dessas beldades era um privilégio restrito, concedido somente após uma morte gloriosa, ocorrida no campo de batalha. Para nós, reles e pacatos mortais, elas estavam todas ali, presentes de corpo e alma, quiçá tangíveis, para deleite de nossos sôfregos olhos.

Nutríamos nada mais do que uma adoração platônica pelas formas angelicais que, diante de nós, desfilavam, garbosas, como se a sua existência se limitasse a atormentar as almas masculinas, abobalhadas com toda aquela voluptuosidade. Torturavam-nos, em movimentos que pareciam não ter fim, e deixavam-nos maravilhados diante de toda aquela generosidade concedida pela Mãe Natureza, ou, quem sabe, por repetidas dietas alimentares, combinadas com horas diárias de exercícios físicos. Não nos importava a causa de tal fenômeno estético, mas apenas suas agradáveis conseqüências, acentuadas pelas roupas sobremaneira exíguas, compatíveis com o dia quente que fizera.

De vez em quando, algum dos colegas se exaltava, e murmurava algum gracejo nada requintado, daqueles que, em sendo ouvido pela destinatária, seria prontamente correspondido com palavras de baixo calão, incompatíveis com moças de tão fino trato. Felizmente, nunca houve tal acontecimento para ensejar tamanha conseqüência, o que certamente teria comprometido a magia do momento.

Regozijados com aqueles poucos minutos de visões magníficas, trilhávamos, enfim, o caminho de regresso à sala de aula, para dar seguimento ao aprendizado acadêmico. Voltávamos embriagados com toda aquela delicadeza e formosura, e com a certeza de que, no dia seguinte, se ensolarado, poderíamos fazer tudo outra vez.

(Crônica publicada originalmente em livro em homenagem aos 70 anos da Faculdade de Direito da UFSC. Meio exagerada em alguns momentos – para não dizer piegas e cheia de clichês, em outros – mas para a época valeu.)

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

MEA CULPA

Creio que devo alguma explicação sobre os textos que publiquei/reproduzi recentemente, sobre o fechamento do Senado. Pareceu até que eu defendia o fechamento dessa casa legislativa.

No entanto, é justamente o contrário. Na verdade, quis mostrar que muitos setores da imprensa (e que alguns chamam de "mídia golpista") faziam pressão para extirparmos do país um câncer institucional. Todavia, erraram ao diagnosticar a doença: o câncer estava em alguns senadores, e não em todo o Senado.

A intenção, naqueles textos, era a de alertá-los para os perigos que os momentos de grande comoção nacional representam. Naquela época, a opinião pública, facilmente manipulável, tendia a apoiar qualquer "salvador da pátria" que se dispusesse a tomar o poder absoluto para "acabar com a corrupção". Qualquer semelhante à direita com o golpe de 1964, e à esquerda com Hugo Chávez, não é mera coincidência.

Vejam, nos meios de comunicação, que Rafael Correa - presidente equatoriano - pretende fechar o Legislativo daquele país, argumentando que é uma instituição corrupta. O pior é que grande parte da população equatoriana apóia a medida.

Fechar instituições públicas não é solução para resolver problema algum, ainda mais o da corrupção. Afinal, o poder da instituição fechada terá de deslocar-se para alguém, no caso, para um déspota, esclarecido... ou não. E, quando todo o poder estiver nas mãos desse déspota, será fácil corrompê-lo. A História já comprovou isso muitas vezes.

Infelizmente, não consegui disponibilizar um texto do Elio Gaspari alertando para esses perigos. Seus argumentos para a manutenção do Senado eram muito mais bem redigidos que os meus. Mas fica o alerta: é mais difícil, porém mais seguro para a democracia, moralizar o Senado, do que fechá-lo. Afinal, depois deste, quem virá? A Câmara? O Supremo Tribunal Federal? O voto direto e secreto?