quinta-feira, 16 de agosto de 2007

CENTRO DE INTEGRAÇÃO EMPRESA-ESCRAVOS

Ingressar numa universidade de ponta, num curso tradicional, parece ser o sonho de toda pessoa (e principalmente dos pais dela), que assim vincula o estudo nesses centros de excelência à garantia de emprego certo após a formatura. Ao menos foi isso que pensei há alguns anos, quando, por sorte, consegui ser aprovado no vestibular.

Lêdo engano! O mercado de trabalho está saturado de jovens recém-graduados que, não obstante a formação altamente qualificada, engrossam as filas de desempregados, ou, ainda, buscam trabalhos abaixo das suas qualificações, com o intuito de garantir a sua sobrevivência. Esse é o grande dilema do jovem trabalhador brasileiro: durante a faculdade ou ensino médio, é comum arranjar um estágio, "para aprender na prática o conteúdo", ou para ter dinheiro mesmo. Todavia, ao formar-se, engrossa a fila de desempregados qualificados, uma vez que não tem "experiência comprovada", requisito essencial para o mercado de trabalho, e as ocupações para inexperientes foram tomadas pelos estagiários, de qualificação semelhante, porém desprovidos do estorvo da proteção dos direitos trabgalhistas. E isso para não mencionar a grande maioria de pobres coitados que sequer chega ao nível de estagiário, tendo de abandonar os estudos ainda no primeiro grau, obtendo sua sobrevivência em sub-empregos.

A culpa disso tudo? Um sistema trabalhista perverso que, em detrimento do bem-estar social dos que vendem seu serviço, busca apenas arrecadar recursos para um Estado degenerado, por meio de vultosos encargos sociais que desestimulam a contratação empregatícia. Como se não fosse o bastante, combina-se a tanto um emaranhado de sindicatos enfraquecidos, atrelados ao Estado, que, em vez de lutar pelo bem da classe que representam, tornam-se estruturas burocráticas, apáticas, cujo objetivo velado passa a ser o de formar uma elite sedenta de poder (e cargos), mesmo que para isso tenha de apoiar incondicionalmente velhas oligarquias.

Por isso que, em anos recentes, as empresas descobriram esse filão tão promissor na gestão de recursos humanos. Quem não gostaria de obter trabalhadores eficientes, pagando um salário baixo (chamado de bolsa-auxílio), e sem conseqüências indesejáveis, como direitos trabalhistas básicos (férias, por exemplo), encargos previdenciários, podendo ser demitidos sem qualquer cerimônia (e pagamento de rescisão), mediante uma simples revogação de contrato? A redução de custos com recursos humanos é fantástica! Pelo preço de um empregado formal, é possível contratar até vinte (!!) estagiários, que obedecem sem reclamar, pois o mercado é concorrido, e existem milhares de outros universitários à espera de uma vaga para ocupar.

Para ajudar as empresas na obtenção desses pequenos servos, surgiram os Centros de Integração, organizações não-governamentais que constituem bancos de dados com cadastros de estudantes, e bancos de vagas oferecidas pelas empresas contratadas. Para cada estagiário aliciado, a empresa contratante paga uma módica quantia mensal à organização, a título de remuneração pelo serviço prestado; livre de tributos, pois o Estado não pode exigir dinheiro de uma instituição de "interesse público", por mais lucrativa que seja. Incrível: no passado, que traficante de escravos teria a idéia de cobrar dos senhores de engenhos uma taxa periódica, em razão do negro que lhe fôra vendido? Se vissem como se lucra atualmente com a escravidão, teriam mandado a Princesa Isabel às favas, bombardeariam os navios ingleses que patrulhavam os oceanos, e retornariam à sua atividade lucrativa, recheada de novos conceitos.

Talvez, num futuro (nem tão) distante, a figura do estagiário seja lembrada como, hoje em dia, lembramo-nos dos servos na Europa Ocidental durante a Idade Média ou na Rússia do século XIX. Afinal, as relações de exploração não costumam ser lembradas como tal no tempo em que ocorrem, mas tão-somente através da reflexão das gerações posteriores. (originalmente publicado em 02/12/2003)

Um comentário:

Reverendo disse...

Parece que nada mudou mesmo de uns anos pra cá.